Estive me perguntando se essa noite o barulho no telhado foram os morcegos do Butantã.Eles invadem quartos à noite aqui, voam e às vezes dão voltas pela minha lanterna japonesa com o desenho de Amaterasu flutuando no céu.Era um baque surdo misturado com passos delicados, garras e danças de asas noturnas pisando no som de “God´s gonna cut you down”; o teto balançava e me lembrei de uma vez quando morava num lugar onde todos nos odiavam e ladrões pularam os telhados: saí para a rua para alertar sobre o perigo, mas deram risada da minha idéia tola.
Eu segurava uma faca nas mãos.
Barulhos, barulhos noturnos.A mão quente curtindo uma febre embaixo de um castelo de cobertas.
Eu prefiro morcegos me enlouquecendo no tap-tap fazendo um Johnny Cash, eles me levam para a idéia falsa de que vou buscar redenção a vida inteira e me afastam do flashback que as pessoas irão me dar um último adeus e a morte vai lampejar como a grande iluminação final (no final).Eu, eu estive naquela máquina de exames que faz um barulho metálico e frita tua mente em busca de um diagnóstico, uma resposta para os meus netos que irão se preocupar: o som dela nem de longe era tão agradável quanto o desses merdinhas sapateando que me entretêm como um rei.Máquina maldita, remédios malditos e lamentos malditos sobre uma possível crise: tu és tão doente quanto os outros, porque ir em busca de uma cura?Vivemos doentes de alguma forma, feios, pobres e sem alguém para se importar.
Se eu fosse um BBB tudo ia ser pior, nossa, como seria...
Eu ouço o som deles no meu teto, retumbando em uníssono.Sinto medo, mas não é tanto como daquela vez em que engoli água salgada e vi a mulher do mar me arrastar no mar em seu vestido.
Morcegos, morcegos na minha cabeça e no meu coração.
Morcegos para sempre.
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