quarta-feira, 15 de abril de 2015

homúnculo

Eu tive um sonho. Desse delírio efêmero teu corpo ganhou o molde. Uma fina linha de argamassa elaborada de sangue, cinzas e luxúria; invisível aos olhos alheios, percorreu a submatéria e, sutilmente, preencheu os espaços entre os meus dedos. Integrou o vazio. O élan emulsionado. Nasceu o teu corpo. Plasma e elementais escorrendo em profusão em uma sala escura. Uma argila magnânima e leve.
Nasceste. Um gato preto testemunhou a sua origem.
A vida toma forma dos caminhos erráticos e a tua, minha criança, é somente mais uma das incongruências fantásticas engendradas pelo homem de imaginação fértil. És um conto, uma alegoria viva; e teu destino é vagar por entre as terras propagando esperança por meio da sua imperfeição.
Vá para longe do teu criador, vá encontrar a tua estrada que, certamente, terá um fim. Um sopro é a tua existência, e o vento propagará esse hálito; hás de ser parte dessa metrópole e serás condecorado em um trono por homens simplórios.
Inumano e profano, demasiado ingênuo; herdarás os princípios humanos e os rasgará no dia da sua morte.
Vi tudo nas entranhas da lebre. O teu fim. Previsível. Efêmero. Sou um pai zeloso. Só o alerto sob os perigos da sua vida futura porque a minha se finda aqui: e tu carregarás o meu sangue, ó primogênito errático. Não voltarás para casa, não herdarás nada.
E em toda a sua trajetória, homúnculo serás.