Passamos a catraca. Batemos o cartão no sensor. Fomos revistados.
Tinha uma “pausa-reunião” de uma equipe no meio do caminho. E tínhamos que esperar, era uma das regras. A reunião era feita no meio do caminho, entre a passagem das alas e o refeitório. Tudo era meticulosamente feito para nos atrasarmos e dobrar períodos. Não era permitido falar durante a espera. Ficamos ali, quietos, esperando o término da reunião.
O supervisor falava de metas, motivação, dava umas broncas aleatórias na equipe, falava do sentido da vida, do feriado que teriam de trabalhar com orgulho, etc..
Eu dei umas olhadas marotas para ela vendo aquela cena. Ela retribuiu.
Disse no ouvido dela:
- Eu tenho um desenho desse supervisor lá no banheiro.
Ela riu. Baixinho.
Quando, finalmente, a pausa-reunião terminou, apressamos o passo. Passamos a catraca, batemos o cartão de acesso. A sala era à prova de som. Entramos na nossa ala.
Paramos. A cena.
Um som ensurdecedor de desespero e trevas. Imagens de uma central de telemarketing.
Um som ensurdecedor de desespero e trevas. Imagens de uma central de telemarketing.
O Angélico mordia a cabeça e arrancava um pedaço do cérebro do pobre cara do cubículo com bandeirinha. Destruição e morte. Sangue. Vísceras em cubículos. Gente dando machetada em chefes e funcionários, enforcamentos com fios de telefone. Gente mordendo a cara dos outros, arrancando línguas à força e abrindo barrigas com as mãos e dentadas violentas. Uns, mais desesperados que outros, quebravam os vidros e se jogavam pelas janelas. Ouvíamos os corpos caindo em cima dos carros no estacionamento. Um som horrível. Luta. Fome. Tripas e sangue em profusão pelos cubículos.
(imaginem isso em uma câmera lenta…)
Fechei a porta de vidro com força. Os mortos nos olharam.
“Uuhh, hueehhhh!!” – disse o Angélico, olhando para a nossa direção.
Todos olharam com o barulho da porta. A carnificina fez uma breve pausa de três segundos.
Não pensamos em mais nada. Só havia o horror. Peguei na mão da Nadja (nossa, que macia…), saímos correndo em direção ao refeitório. Caos. Sirenes. Corremos em direção aos elevadores. Alguns corriam com o barulho infernal dos alarmes, outros empunhavam seus facões e gritavam “morte aos comunistas”, mas não ficamos para ver mais.
(imaginem isso, de novo, em uma câmera lenta…)
Foi como eu disse, todo mundo já esperava isso. Era um processo, uma mensagem em uma rede social. Um inferno de zumbis com camisas da seleção brasileira matando uns aos outros. O meu apocalipse.
O nosso apocalipse.
(sobem os créditos da apresentação)