domingo, 10 de janeiro de 2010

con ti se va mi corazón (ou como nos tornamos reis) parte III


III

As páginas se soltam. Desfazem. A cerveja tem mais gosto de ferrugem a cada noite que passo com esses manuscritos na barriga.
O cheiro é intoxicante. Preciso limpar a sujeira do sótão. De algumas coisas.
Uma página rasgou na segunda noite, foi ali, na minha mão que aconteceu. E me deu um troço estranho de respeito, como o pai de Lizzy que tem um certo apreço por seus momentos na biblioteca particular. Me perguntei por que um velho tem tanto apreço por um momento com livros, foi um questionamento relâmpago, um resquício de uma coisa besta que nascia dentro de mim.
Então, senhor Bennet, hoje eu entendo. Livros podem ser a cerveja enferrujada que desce goela abaixo em dias de inverno nesses campos verdes vitorianos.
Com essa catarse vergonhosa de crise de meia idade, encerro um pensamento que julgo importante; e ainda fico preocupado com o rasgo no livro. Tô velho mesmo...
E gostando do livro.
Na segunda noite de leitura, eu levo uma fita especial para atar as páginas velhas em respeito à Elizabeth (e porque não, sua família). Fui numa tarde no Maine em busca de algo para consertar o que vinha me salvando. Pesquisei na internet sobre a fita especial para reparar páginas, lá, no notebook sagrado de Christine...
Aguardo respostas e as páginas (já restauradas com a fita especial) não se soltam mais com facilidade. É um tesouro nas mãos de um plebeu.
Christine só me perguntou se eu tinha usado o note. Disse que sim. A senha não era mais o nome do bar em que nos beijamos pela primeira vez.
-Mudei faz tempo, não faz drama por isso. -disse ela, colocando os óculos.
 “Dramático” - sou um dramático agora.

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