“Um cachorro solitário faminto por um sonho, uivando para o céu escuro e as estrelas.”
Era o que dizia a canção dos Blue Hearts em japonês, essa que chegou tímida e inesperada pelos fones baratos; aquela que foi cuidadosamente escolhida em diversas buscas, cookies e cache. Todas as procuras, todas as palavras, todo o meu histórico do Google, todos os meus gostos culminaram nesse momento, nesse texto; e eu não tenho vergonha de nada, podem me denunciar, vazem essa porra no Wikileaks, essas minhas putarias e perversões, pois não devo nada a ninguém.
Realmente não me importo.
Vamos lá, deixa eu explicar… Eu ouço um som, e essas palavras pedem uma permissão nesse ritual, tocam o meu braço e imploram por uma vez no mundo. É uma possessão consentida. Meu histórico é a minha vida. É o meio. A putaria, a Belladonna, a Jeanna Fine, as idiossincrasias sintomáticas, e as buscas por doo wop e punk rock… tudo isso é o meu legado. De tudo isso nasce uma história, um pensamento. E quando faço essas coisas, de escrever, de postar uma porra de um pensamento, o pior insulto que recebo é ser chamado de “inteligente”: não o sou, considero-me o mais tosco e torpe da turma do fundão; dou risada de coisas ridículas e jamais me deixam dizer o que quero, pois posso envergonhar a todos. As pessoas sempre me interromperam quando começo um pensamento mais ou menos coeso, e acho que isso foi a maior sorte que tive na vida. Conheço gente intelectual, inteligente, real, e estou longe disso; tampouco anseio esse status.
O que eu quero atingir com esses textos é aquele olhar silencioso, o menear da cabeça simbólico dizendo “podicrê”...
O que eu quero atingir com esses textos é aquele olhar silencioso, o menear da cabeça simbólico dizendo “podicrê”...
Sou burro, caralho! Às vezes não entendo tramas simples, enredos, contas e operações básicas, confundo a gramática, demoro algumas horas para compreender as regras de um jogo… Tem dias que me pego em questionamentos e me esqueço de quem sou: leva um tempo para voltar e relembrar a minha trajetória. Acho que, no fundo, estou condenado àquelas histórias de boteco bem triviais:
“Lembra dele? Então…”
(suspiro)
(suspiro)
O cachorro uiva lá fora.
A canção, um dia, acaba.
Essas coisas aqui nessas linhas não são complexas; na verdade, elas buscam só a confusão, o embaralhamento. Não há nada definido no meu discurso. É tudo um grande embuste zen-surrealista à lá Dadá.
E há os que tomam essa confissão, esses textos de ficção, como verdades absolutas. Mal sabem que sou guiado por cartas de Tarot e pela aleatoriedade das regras de um roguelike, e, raramente, falo alguma verdade nessas palavras. Mal sei como terminarei o meu dia ou qualquer coisa.
Tudo isso posto desse jeito, cá estou, agora, com uma luz na cara, no meio do palco da escola, após o hino nacional ter sido tocado numa vitrola no pátio com os militares devidamente louvados em coro de crianças em uníssono. E eu sinto uma fúria imensa, pois as palavras sempre me deixam puto quando saem assim no papel. Tenho que ser contido, começo a gritar! Quero quebrar a vitrola. Estou ali, no meio do palco. O cachorro uiva para ser ouvido:
- E essas palavras aqui, esses textos…
(todos os personagens o seguram)
- Deixa eu dizer, mano, não me segura não, porra! Me larga, caralho…
(ele respira fundo)
- Isso aqui, esses textos, essas coisas, esse blog...
(resfolegando)
- ...é somente eu batendo o ponto e dizendo “tamos aqui”, é um uivo, um grito na madrugada que nem todo mundo escuta... morô?! E tá ótimo assim!
(todos o contemplam silenciosamente)
E eu brigo, bato os braços, agito a noite inteira sozinho no pogo para uma banda punk sem fãs. Depois, quando me canso, eles me deixam num canto, e sabem que eu ficarei bem, só preciso de um tempo, de um cigarro, de uma canção, de uma busca…
… depois a galera me paga um X-Tudo lá na Vital e eu vou lá pro ponto esperar o meu ônibus. Esse é o meu momento de reflexão profunda.
Chego em casa. Mal é dia, é noite, sei lá que horas são… nem tá passando Teletubbies ou VR Trooper...
E nesse momento, lá fora, aqui nas ruas do Velho Oeste, um cachorro aprisionado em uma casa de mármore uiva dolorosamente todas as noites. Isso não é literatura, isso é um fato: esse cachorro existe. É a única verdade nesse texto, esse cachorro… Ele, todas as noites, é acompanhado por todos os vira-latas da quebrada, e eu, às vezes, (acho…), sou um deles. Não existe tristeza, nem alegria: somente esse momento do uivo, do texto.
No fim, somos todos como aquele prisioneiro que toca um Blues na gaita; o personagem figurante na Malhação fingindo que tá conversando; ou o fundo de uma pintura. O cachorro que uiva para a lua…
“Tamos aqui”... não se esqueçam.
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