domingo, 5 de agosto de 2007

você é o/a cara/mina no terraço.

Ontem à tarde estavam cortando as árvores no bairro.
Todos estavam na rua passeando e curiosos pela "agitação" tão incomum na área, eu me sentei no terraço da garagem e fiquei vendo os caminhões que chegavam para carregar as centenas de kilos de folhas e galhos mortos.Na praça eu não havia reparado em certas coisas, como por exemplo as outras árvores e palmeiras que balançavam contra o vento.
Perguntei se elas já estavam ali e imaginei que estavam plantando novas no lugar, mas era um idéia bem idiota: por que plantariam novas se carros e caminhões vazios se enchiam pela porra da rua inteira com terra e folhas?
Bem, na verdade eu queria uma resposta (nem que ela fosse irracional) só para entrar na minha cabeça do porque delas estarem sendo arrancadas...
Ao passear pelas ruas com o meu cachorro, tudo o que se via eram montes e montes de pilhas disformes e verdes sem significado, salpicadas com terra.Isso me lembrou de uma tempestade que vi uma vez na vila quando era adolescente: uma chuva de vento violenta que derrubou árvores e tudo que viu pela frente.E lá na rua todos foram "admirar" os estragos: postes e fios cairam em carros, animais mortos ,telhados arrancados ,vassouras e bacias tirando a água de casa.Aquilo era uma situação em que você balançava a cabeça concordando silenciosamente que coisas no mundo merecem respeito e nem sempre tem uma explicação...
A casa do meu tio que ficava logo abaixo a minha no mesmo quintal se enchia de água com qualquer chuva, pela sua estrutura precária em que foi construída na época dava uma dó quando lá estavam eles de bota tirando água inutilmente pelas bacias ( às vezes furadas) e íamos ajudar.A minha casa era um pouco mais alta(acontecia pouco isso), mas como era velha e toda esburacada tinha problemas de infiltração em todos os cantos e lá estavámos nós colocando bacias e panelas pelos furos enormes dos tetos.Uma vez quando eu estava na oitava série, estudando na mesa da cozinha levantei e fui mijar, enquanto segurava o pau escutei um barulho enorme de destruição: a porra do teto caiu exatamente onde eu estava!Umas vigas enormes de madeira e concreto pesado iriam rachar a minha cabeça como um melão atirado contra um taco desses que a gente brinca na rua com bolinha de tennis, fiquei imaginando se me mataria na hora ou ficaria um vegetal para sempre; imaginava também minha mãe entrando e chegando e me vendo naquele estado.Foi o que pensei :em crânios arrebentados e eu de pijama todo ensaguentado.
Não foi uma experiência que me mudou para sempre como você vê as pessoas falando "nossa isso mudou a minha vida ,eu fui salvo"...
Pelo contrário, eu não dei a mínima.Se morrer, tinha morrido e não havia nada o que se pensar; como as árvores e animais que eu via em meio a água com seus rostos surreais expressando tristeza ou sofrimento.
Ah, e o Yusuke ia me visitar com a Botan se eu morresse:isso seria legal.
Eu não me senti exatamente como Locke em Lost, foi mais ou menos como Bruce Willis em "Unbreakable":as pessoas é que se admiravam mais que você.
"-Coitado do moleque ,morreu estudando !"
Meu, o caralho que eu quero morrer estudando!
E só para concluir, essa não foi a primeira vez que isso aconteceu: uma vez depois disso o teto do quarto da minha mãe ruiu e eu estava deitado com ela na cama e por menos de um metro não caiu em mim.Aí você para pra pensar no assunto com mais calma.
"-Coitado do moleque ,morreu dormindo com a mãe do lado!"
"-Mas que caralho um homem daquele fazia na cama da mãe ,que bebezão!"
É ...
Você pára pra pensar nessas coisas e as possíveis explicações envolvidas; se arrancam as árvores, tanta gente morta, porque você quase morreu com tetos desabando, parece que nada te satisfaz e você vive só se perguntando e questionando.Um mar de perguntas e pontos de interrogação destruindo os telhados das nossas mentes fudidas.
Você é o/a cara/mina no terraço dessa merda de vida, observando coisas serem arrancadas e plantadas sem sentido num processo sem fim ou respostas como no Lost.
Certas coisas não tem explicação, são momentos em que não se pensa muito no que aconteceu e isso me parece o mais trágico: é tão rápido que só se admira a destruição e vigas que poderiam estar em cima de você.E às vezes elas estão...
Talvez seja um momento em que a Natureza não pensou direito e resolveu destruir com poesia uma parte do mundo ,e ela chora de arrependimento pois vê os homens chorando e nunca choraram por ela...
Se existe um significado nisso, é que certas coisas não são marcadas a ferro e fogo :sentimentos e naturezas se confundem, sim se confundem nesse mundo e talvez não seja a última vez que você vê certas coisas nesse terraço.
Você pergunta por que se importa.

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